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Naidison Baptista- Coordenador Executivo da ASA
Foto de André Teles |
Na semana do Encontro Nacional de Comunicação da ASA, o boletim informativo da Rede, o Compartilhando Ideias, chega a sua 100ª edição. Para celebrar a marca, entrevistamos o coordenador executivo da ASA pelo estado da Bahia, Naidison Quintella. Na conversa por telefone, Naidison falou dos aprendizados da rede na construção de seu processo de comunicação, avaliou os impactos das ações de comunicação da ASA na garantia do direito à comunicação e deixou suas expectativas do Encontro Nacional, que começa nesta quarta e se estende até sexta-feira. Confiram!
ASACom - Qual a importância da comunicação na rede ASA?
Naidison – A ASA está sendo capaz de trabalhar um aspecto multifacetado da comunicação. Não trabalhamos apenas uma linha e sim linhas diferenciadas, múltiplas, com muitos aspectos que se complementam e se enriquecem. Esta é a característica específica e inovadora da comunicação na ASA. O processo de comunicação para a rede tem sido muito importante e significativo no sentido de dinamizar internamente as relações entre as organizações e pautar os meios de comunicação social e outros espaços sobre a convivência com o Semiárido.
ASACom – A ASA também tem lançado mão da comunicação como uma estratégia educativa. Gostaria que o senhor falasse um pouco desta dimensão da comunicação na Rede.
Naidison – Neste sentido, comunicação é efetivamente um processo pedagógico-político dentro da ASA. Queremos despertar os agricultores e agricultoras para a dimensão de que podem, sabem e têm condições de produzir conhecimento. A ASA tem essa marca. A ASA não é uma rede que repassa tecnologia para pessoas que não têm conhecimento, não produzem conhecimento. A nossa concepção é o contrário. Os agricultores e agricultoras produzem conhecimento, têm conhecimento e tanto fazem isso que, apesar de todos os massacres, estão vivos e vivas.
Os boletins [das experiências dos agricultores] partem desta concepção e estimulam a comunicação, fazendo com que o comunicador seja capaz de assessorar o agricultor, a agricultora, na sistematização de sua experiência.
Uma vez sistematizada, a experiência se torna objeto de debate, conversa, intercâmbios com outros agricultores e outras agricultoras na perspectiva de ampliar a linha das ações e das experiências.
A experiência sistematizada também abre a perspectiva de se transformar em política [pública]. O P1MC e o P1+2 estão se transformando em política porque foram muito bem sistematizados e se pode debater com o poder público para dizer que queremos isto, com esta metodologia, com este custo e este resultado. Com isto, a ASA se torna capaz de interferir em políticas públicas.
ASACom – Olhando para a trajetória da comunicação da ASA, qual o maior aprendizado que a rede acumulou?
Naidison – Acompanhei a comunicação desde o início, quando a gente tinha dificuldade de identificar qual era a estrada do processo. Houve tentativas de se ter um processo nacionalmente e regionalmente construído dentro de determinadas normas. Só quando a gente se libertou desta dimensão é que fomos capazes de caminhar com mais liberdade. Eu acho que o que nós temos que celebrar agora são as várias dimensões.
Primeiro a dimensão das organizações que já incorporavam [a comunicação] e melhoraram e se qualificaram mais os processos de comunicação a partir de sua presença na ASA. Temos na Bahia o MOC, organizações em Juazeiro, o SASOP, o Sabiá, o CAA que tinham dimensões de comunicação e incorporaram novas perspectivas.
O que temos que celebrar é que, em respeito à autonomia destas organizações, a ASA soube inserir novos elementos, beber destas organizações novas experiências e a partir daí que o processo cresceu. Num cresceu como um processo controlado a partir do Recife. Essa não é a nossa função. Mas a partir de um processo onde a perspectiva de comunicação da ASA oferece elementos às organizações que pertencem à ASA.
A outra dimensão foi o crescendo gradativo na produção dos nossos materiais. A ASA é conhecida pela qualidade técnica e de conteúdo político-pedagógico dos nossos materiais que são solicitados por outras organizações para que possam utilizar em capacitações, eventos, encontros. E nós temos, deixando marcada a nossa autoria, cedido para grupos e mais grupos.
Tem sido um material rico nas mais variadas temáticas: de como tratar a cisterna, convivência ampla com o Semiárido, textos mais aprofundados, materiais de qualidade de como trabalhar a cisterna nas escolas. É uma gama variada de materiais, a maioria deles dirigidos aos agricultores e agricultoras ou aos próprios animadores. Neste sentido, nós trabalhamos muito e crescemos em oferecer subsídios para as pessoas que trabalham conosco.
Uma terceira coisa que fomos descobrindo gradativamente é o espaço de falar pra fora. A ASACom desempenha um papel importante porque ela mapeia os espaços, mapeia os problemas que estão por emergir para que a gente possa tomar posição com relação a isso.
ASACom - Começa nesta quarta-feira o Encontro Nacional de Comunicação. Quais são as suas expectativas para este encontro de comunicadores e comunicadoras da Rede?
Naidison - O Encontro de Comunicação é basicamente um momento para curtir o que está aparecendo nos vários espaços e com isso melhorar e qualificar a nossa atuação. Não é um encontro onde os consultores vão dizer o que é comunicação, como se faz. Nós vamos ser capazes de beber das experiências, perceber como isto é feito, como isto se desenvolve. E a partir daí publicizar mais essas experiências e aprender com elas.
ASACom – No Semiárido, os meios de comunicação - TVs, rádios, jornais - assim como a terra e a água, também estão concentrados nas mãos de políticos e empresários da região. Nesse contexto, o senhor acha que o trabalho de comunicação da ASA contribui de alguma forma para romper com essa estrutura?
Naidison – Eu acho que tem contribuído muito na medida em que pautamos com perspectiva diferente o conteúdo destas mesmas redes de comunicação. Quando nós fizemos uma ampla campanha em nível nacional, quando nós pautamos TVs, jornais, revistas, etc e elas começam a colocar o conteúdo da convivência com o Semiárido e não apenas o conteúdo do combate à seca, nós ganhamos um espaço imenso. E esse espaço é o da democratização da comunicação.
Não nos foi dado este espaço. Nós conquistamos pela qualidade de nossa ação e qualidade de nossa interferência em termos de comunicação.
Eu acho que isso é um ganho imenso, naturalmente com seus limites porque nem sempre conseguimos pautar e colocar aquelas coisas que gostaríamos. Mas se olharmos há 10 anos e hoje, o significado disso é muito grande. Se olharmos a imagem do P1MC e da ASA, veremos que é respeitada nos vários níveis de comunicação. Isso é uma conquista forte, significativa.
Há um outro nível, onde a gente vai roendo a corda em pedacinhos menores, que são os processos que a gente cria internamente e estão espalhados em todo o Semiárido. Vamos pensar no que significa os programas de rádio que tematizam o Semiárido e as perspectivas de convivência com a região de modo bom e bonito. Estes programas vão para todas as organizações e elas utilizam ou em rádios comunitárias – que são experiências de reagir aos monopólios da comunicação – ou nos programas das organizações que algumas delas têm em rádios comerciais, ou vão para outras rádios que recebem e reproduzem [os programas]. São espaços que também conquistamos.
Internamente, a multiplicidade de boletins, de conteúdos sobre a convivência no Semiárido que são veiculados é uma quantidade imensa com a qualidade que nos é peculiar. [Esse material] chega aos agricultores, agricultoras, na ponta, e cria autoestima, entusiasma as pessoas, faz com que se sintam produtoras de conhecimento. Ela inverte a lógica do processo de comunicação. Torna as pessoas que são geralmente ouvintes em sujeitos do processo de comunicação. E essa é uma dimensão impressionante na perspectiva da democratização da comunicação.
Verônica Pragana e Gleiceani Nogueira - ASACom |
30/11/2010
Fonte: ASAcom |