Em quase todo o Semiárido, atualmente, é muito comum ver uma cisterna ao lado de uma casa na zona rural. Essas cisternas caseiras têm uma enorme importância no tocante ao abastecimento de água para o consumo humano, pois serve para colher e guardar durante o período de chuva, a água que mata a sede da família. Normalmente, elas armazenam 16 mil litros de água, quantidade suficiente para abastecer uma família de até 8 pessoas com água para beber e cozinhar os alimentos o ano inteiro. Com essa função, as cisternas têm levado conforto, cidadania e saúde para milhares de famílias sertanejas.
Na propriedade familiar de dona Josefa Freire e seu Manoel Freire em Lagoa Grande, comunidade do interior de Sobradinho (BA), existe uma dessas cisternas que por sinal tem uma importância muito simbólica na luta pela água de beber no Semiárido. Pois esta foi a primeira cisterna construída pelo Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC) da Articulação do Semiárido (ASA).
Dona Josefa recorda muito bem a data de 23 de novembro do ano de 2000 quando o então Ministro do Meio Ambiente José Sarney Filho esteve em sua propriedade inaugurar junto com lideranças da ASA, a cisterna de Nº 01 do P1MC. “Eu nunca pensei que durante esse tempo, tantas famílias tivessem a água da cisterna, assim como a gente tem aqui”. Declara dona Josefa que também se diz honrada por sua família ter sido a primeira contemplada com este programa em todo o Semiárido.
A família de quatro pessoas, incluindo os filhos Valdemar e Valdelice é do município de Sento-Sé e vieram para Lagoa Grande em 1976 relocados pela Companhia Hidroelétrica do São Francisco, Chesf durante a construção da Barragem de Sobradinho. Nesse período, a comunidade não tinha nenhuma estrutura que garantisse o fornecimento de água. O Casal lembra que para se obter água para beber era preciso se deslocar diariamente até um riacho que fica a poucos quilômetros de Lagoa Grande. Seu Manoel também recorda que nessa época, quando o riacho secava, era preciso cavar cacimbas para se obter água e que às vezes, foi preciso pegar água até no rio São Francisco usando carroças puxadas por animais porque sua casa fica a mais de 10 quilômetros do rio.
Anos mais tarde, a Chesf construiu um tanque comunitário abastecido com os carros-pipas da prefeitura, mas quando esta água não era insuficiente, eles tinham que comprar “carradas águas”, como se costuma dizer nessa região.
Para a família de dona Josefa e seu Manoel, o dia 23 de novembro de 2000 é uma data marcante em suas vidas, não somente pelo ato de inauguração da cisterna, mas principalmente porque a partir dessa data, a vida dessa família sertaneja tornou-se mais digna em diversos aspectos. A partir da cisterna ninguém mais precisa percorrer longas distancias para buscar a água para beber. A água agora está ao lado da casa, limpa e em quantidade suficiente. “acabou meu sofrimento de carregar água de manhã e a tarde. Foi muito sofrimento que a gente passou, ter que ficar enchendo os tonéis de casa com as latas de água pesadas! Mas graças a Deus a gente tem aqui uma água boa, limpa e cristalina, diz dona Josefa que faz questão de lembrar também do empenho pessoal do ex- bispo de Juazeiro Dom José Rodrigues que mobilizou campanhas incentivando pessoas e instituições a adotarem cisternas para que as famílias da região conquistassem sua água.
Além da água de qualidade para o consumo conquistada a partir da cisterna, a família de dona Josefa e seu Manoel ganhou mais conhecimentos sobre as formas apropriadas para se viver melhor no sertão a partir da proposta de Convivência com o Semiárido. Na propriedade, o sistema de produção é baseado na criação de animais porque a roça não oferece uma produção segura todos os anos. As cabras, as ovelhas e as galinhas é quem garantem a alimentação de todos e ainda geram algum dinheiro diante de eventuais necessidades. O pasto natural da caatinga alimenta o rebanho, e os barreiros abastecidos pela chuva assegura a água dos animais.
Todo o simbolismo que trás essa cisterna, está descrito na placa de sua inauguração que diz: “Esta cisterna representa um marco histórico para todos os que acreditam que a parceria, a solidariedade e a co-responsabilidade propiciará uma vida digna no Semi-árido brasileiro.”
Muita coisa mudou na vida dessa família sertaneja que a 30 anos teve que deixar sua terra inudada pelas águas da Barragem de Sobradinho. Porém o momento mais significativo nessa trajetória de superação se deu a partir da presença de uma cisterna em sua propriedade, que além de trazer água trouxe conhecimentos sobre como o povo do sertão pode encontrar alternativas para vencer desafios e viver bem nessa região.
Fonte: IRPAA
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