sexta-feira, 14 de dezembro de 2012
terça-feira, 11 de dezembro de 2012
quarta-feira, 5 de dezembro de 2012
“Não comemos papel, nem carvão!” Seminário discute a monocultura do eucalipto em Vitória da Conquista
Rodrigo de Castro - Comunicador Popular da ASA
Ao longo da última década, a monocultura do eucalipto se
expandiu e vem dominando a paisagem das áreas rurais da região sudoeste da
Bahia. Assim como já ocorreu em outras regiões do estado e também do Brasil,
milhares de hectares da árvore, nativa da Austrália, estão ocupando
gradativamente áreas que antes eram dedicadas a produção de alimentos.
A fim de debater o monocultivo do eucalipto, suas implicações
e consequências para a população, o Fórum de Entidades e Movimentos Sociais do
Sudoeste da Bahia realizou nos dias 29 e 30 de Novembro o Seminário
“Monocultura de Eucaliptos”, em Vitória da Conquista - BA.
O eucalipto é cultivado no Brasil desde a década de 1970.
Utilizado principalmente na produção de celulose para a indústria de papel,
grandes corporações como a Veracel e a Fibria (antiga Aracruz Celulose)
disseminaram o cultivo por extensas áreas, que chegam hoje a 6,5 milhões de ha
em todo o país. De forma secundária, o eucalipto é utilizado para alimentar
polos siderúrgicos com carvão vegetal. O crescimento da área plantada de
eucalipto na Bahia está diretamente ligado à demanda de carvão do polo
siderúrgico de Betim, em Minas Gerais. Segundo a organização do evento, o
estado é o terceiro maior produtor nacional, com 658 mil ha de área plantada.
Para a professora Gilca Garcia, da UFBA (Universidade Federal
da Bahia) e palestrante convidada, a questão mais grave é o do modelo econômico
que norteia a monocultura do eucalipto: “O eucalipto precisa de grandes áreas
para ser economicamente viável, e por isso as terras [dos pequenos produtores]
estão sendo compradas pelos grandes”. A estrutura fundiária, de alta
concentração de terras nas mãos de grandes produtores, e a própria natureza do
eucalipto, que demanda pouca mão de obra, cria uma massa de desempregados que
vão inchar os subúrbios das áreas urbanas, que não tem estrutura para receber
tal contingente de pessoas, gerando desemprego, aumento de criminalidade,
precarização dos serviços públicos, entre outros problemas crônicos das cidades
brasileiras.
A degradação dos solos
e a poluição das áreas de cultivo, graças ao uso de agrotóxicos no manejo são
problemas graves que foram debatidos intensamente na plenária. O agricultor
Francisco de Araújo, conhecido como Chicão, contou o exemplo da comunidade Lagoa
de Melquíades, na zona rural de Vitória da Conquista, onde mora. “Até em cima
da nascente de água doce já plantaram eucalipto, já denunciamos, mas não
resolveu. (...) O que a gente está passando dificuldade, é o veneno que eles
usam na plantação, eles tratam do mato jogando veneno, o que afeta os nossos
pastos. Já denunciamos isso também, mas eles continuam fazendo as escondidas”.
Representantes de comunidades rurais de diversos municípios
do sudoeste e sul baiano e do norte mineiro, presentes no seminário, relataram
situações semelhantes, onde solos estão sendo degradados, nascentes e lençóis
freáticos ficam mais secos a cada dia e direitos básicos, como a saúde e o
acesso a terra são desrespeitados.
Nas oficinas temáticas, que trabalharam assuntos como
segurança hídrica, soberania alimentar e aspectos legais de controle da
monocultura, o seminário buscou discutir e pensar ações que devem ser tomadas
pelas comunidades no enfrentamento da questão. Joaci Cunha, advogado e membro
do CEAS (Centro de Estudos e Ação Social), reitera a necessidade de se buscar
caminhos legais para combater a expansão do eucalipto. Para ele, a iniciativa
popular, propondo projetos de leis para regulamentar as áreas e a forma de
cultivo, é fundamental para proteger os recursos naturais e evitar o surgimento
de grandes áreas plantadas. “Os municípios precisam também de um aparato
administrativo e técnico que faça uma fiscalização eficiente, além de envolver
a população através de órgãos de deliberação, a exemplo do Conselho Municipal
de Proteção ao Meio Ambiente”.
Além de palestras e oficinas, o Seminário realizou também uma
caminhada no centro de Vitória da Conquista, buscando despertar a população
para os problemas causados pela monocultura do eucalipto, que não afetam apenas
os habitantes das zonas rurais, mas também os moradores de áreas urbanas. Como
demonstrou bem um dos gritos de guerra da luta, o enfraquecimento da
agricultura familiar diminui a oferta de alimentos, aumentando os preços. “Se o
campo não planta, a cidade não janta!” Ao final da caminhada, uma instalação
artística sobre o tema simbolizou o protesto pela situação difícil vivida pelas
comunidades que ficam a mercê dos efeitos da monocultura.
Para entender melhor os aspectos legais que envolvem o
assunto, estiveram presentes representantes do Ministério Público, que falaram
sobre a dificuldade que o MP possui para poder atuar nos casos que envolvem a
monocultura do eucalipto. Segundo Mário Medeiros, do Ministério Público
Federal, as nuances das leis que versam sobre meio ambiente no país dão espaço
para que as empresas consigam se livrar de ações movidas contra elas. A falta
de critérios dos órgãos que emitem licenças ambientais também é criticada por
ele, que vê na falta de colaboração do estado um grande empecilho para frear o
avanço do eucalipto. “As ponderações sobre licenciamento ambiental estão sendo
embasadas única e exclusivamente em considerações de ordem econômica, as
considerações de ordem ambiental e social foram deixadas de lado”.
O seminário busca discutir os impactos da monocultura e
propor ações para o futuro. Seu Cordeiro, do Movimento dos Trabalhadores Sem
Terra (MST), relembra que a ameaça do eucalipto para a agricultura familiar é
antiga. “O MST foi o primeiro movimento que bateu pesado na questão do
eucalipto. Hoje alguns movimentos estão engajados no processo, como o MPA
(Movimento dos Pequenos Agricultores), CPT (Comissão Pastoral da Terra) e
alguns outros, mas o MST foi o pioneiro nessa luta, já que estamos nela desde a
fundação do movimento em 1984. Nós somos contra qualquer monocultura, não só a
do eucalipto, porque nós pregamos a diversidade. Nós não somos contra a planta
em si, só questionamos a forma como ela é plantada”.
Para Edilene Alves, integrante do Levante Popular da
Juventude e do CEAS, o espaço de discussão promovido pelo seminário é
fundamental para informar e ajudar as comunidades a enfrentar o problema: “Na
minha região, este fórum vem contribuindo na emenda da lei orgânica que estamos
tentando criar lá no município. Nós sabemos que é difícil, é complicado, mas
não impossível”, afirma.
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